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sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

A tragédia de São Lourenço.


Eu?
Eu sou um enigma
O explícito do indecifrável
As chaves perdidas no bolso
O ''quiçá'' que precede a tragédia
Eu sou a tragédia!
Sou a tempestade que encanta pela avidez
E sou também os raios de sol que cessam a voracidade de céus aterradores
Eu sou o pulo do gato
E sou também a madeira bamba, afoita para forçá-lo
Eu sou a consequência de um caos certo e interminável.


A tragédia de São Lourenço.

                             Todos diziam que era uma tragédia anunciada. Ninguém nunca duvidou do desfecho e quando aconteceu disseram que demorou muito para acontecer. Tem fatos e relatos que tentamos entender o porquê e cada dia que passa mais ficou curiosos em saber que passamos anos ao lado de algumas pessoas e nunca as conhecemos mais profundamente. Só mesmo quando uma tragédia acontece é que sempre dizemos: - Nunca pensei que isto fosse acontecer. Estes sempre são vizinhos, colegas de trabalho, da igreja e ficamos pasmados com tais acontecimentos. Alfonso e Mariel para mim sempre foram às mesmas pessoas. Diferenciar um de outro era impossível. Tinham o semblante igual, cabelos da mesma cor. Olhos negros e profundos e a tez sempre lisa sem enrugar. Quase não falavam e quando se ouvia tinha que prestar atenção para entender. Era um bom dia, uma boa tarde e mais nada.

         Moravam em uma casa simples, na Rua Florencio de Abreu no Bairro de São Lourenço. Cada um trabalhava longe do outro. Não saiam juntos e nem juntos chegavam. Ninguém nunca soube dizer se conheceram a mãe ou o pai deles. Parecia que moravam ali a muitos e muitos anos e ninguém soube dizer se nasceram ali ou não. Quando Dona Joventina sentiu um cheiro esquisito viu que ele era produzido dentro da residência deles. Entrar? Nunca. Ninguém tinha esta coragem. A polícia foi chamada e a porta arrombada. Os policiais saíram rápido. O cheiro e o que viram os espantaram na hora. Um rabecão foi chamado e alguns policiais da perícia com vestimenta apropriada entraram e ficaram horas lá dentro. Do lado de fora centenas de moradores querendo saber o que tinha acontecido e a policia nada dizia. Depois que a policia técnica fez seu trabalho o rabecão levou os dois, ou melhor, o que sobrou deles. Mas morreram de que? A casa teve de ser arrombada, pois, tudo estava trancado. Nisto eles eram meticulosos. Em nenhuma janela havia menos que três ou quatro trancas.

                           As explicações correram de boca em boca na vizinha. Os jornais falados e escritos contaram horrores: Ambos foram encontrados dom a cabeça decepada, o membro cortado à faca, as línguas retiradas à força um horror que só para quem tinha estomago ver. Quem os matou? Por quê? Ninguém nunca viu visitas, namoradas nada. A história seria arquivada e nunca contada até que um dia Pietro criado coragem entrou na casa cuja porta estava entreaberta, olhando tudo descobriu um livro, ou melhor, um diário que surpreendeu muita gente. O Escritor V. A. Soares resolveu escrever a história que foi contada. Dizia para si mesmo que não mudaria nada. Depois que publicou o Livro a Tragédia de São Lourenço muitos duvidaram que ele não mexeu aqui e ali na história. Acredito que muito de vocês não leram o livro então me permito a contar algumas partes, pois tudo aqui não dá. É grande demais.

14 de março                         
                  - Meu nome  é Alfonso, eu e meu irmão nunca conversamos. Ninguém pergunta para o outro o que fez como fez e o que vai fazer no outro dia. Por um destino que desconhecemos temos a mesma aparência. Sem perceber usamos as mesmas roupas, cortamos os cabelos iguais e no mesmo dia. Eu trabalho no Hotel Flor da Mata e ele no Hotel São Joaquim. Não conhecemos nossos pais, só lembramos que morávamos no Orfanato Santa Genoveva. Dizem que não éramos felizes, pois nunca nos viram sorrir. Até hoje não sei o que é isto. Foi na noite de natal que fugimos dali. Sabíamos da estrada de ferro e ficamos de tocaia esperando. Nenhum de nós reclamou de fome ou de qualquer outra coisa. Já escurecendo vimos uma locomotiva subindo a encosta. Passou por nós bem devagar. Foi fácil entrar em um vagão de carga; Dormimos e acordamos com o trem parado em uma cidade. Não era pequena. Pois havia muitos prédios. Resolvemos descer. Cada um pegou uma rua e por mais de uma semana ninguém mais viu o outro. 

                      Já na rua principal alguém me chamou. Olhei e vi uma senhora que deduzi ser nissei. Ofereceu-me um trabalho e aceitei. Ela me deixou dormir em sua quitanda e nem pensei porque ela confiava em mim. Uma semana depois sai à noitinha e encontrei Mariel parado em frente a uma lanchonete. Entramos e fizemos um lanche. Cada um pagou sua parte. Ele estava com um jornal e leu a pagina de alugueis de casa. Achamos uma e o proprietário nos olhou, não falou nada e nos alugou sem cobrar um adiantamento. Era sempre assim, nunca pedíamos, nunca falávamos e todos sempre a ajudar. Eu já estava com doze anos. Cinco anos depois fiz um curto técnico de hotelaria. Consegui um emprego fácil. Daí para comprar um terreno e fazer nossa casa foi um pulo. Os anos passaram, eu não sabia se era ou não feliz. Tudo que fazia parecia que éramos um só, com o mesmo pensamento e a mesma maneira e agir.
                
                          Quando fizemos 23 anos resolvemos fazer uma comemoração. Simples, na Padaria do Zózimo. Sentamo-nos à mesa e pedimos tudo que gostaríamos de comer. Assustamos com uma jovem que parada em nossa frente nos olhava como se nunca tivesse feito uma refeição em sua vida. Ambos puxamos uma cadeira para ela. Posso pedir? Ela disse. Balançamos a cabeça concordando. Ele parecia que nunca havia comido nada. Repetiu diversas vezes e sem sorrir piscou um olho para mim e Mariel. Pagamos e fomos embora. Ao chegar a casa vimos que ela nos seguiu. Não falamos nada e ela entrou. Não disse nada. Não tinha mala mochila nada. Ficou conosco por muito tempo. Dormia na sala na poltrona simples que tínhamos comprado. Eu dormia em um quarto e Mariel em outro. Tudo aconteceu normalmente, ela dormia comigo um dia e no outro com Mariel. Foi com ela que deixei de ser virgem.

 15 de março.

                        Meu nome é Mariel, boa parte de nossa história Alfonso já contou. Esqueceu-se de falar em Marília. Eu nunca soube o que é amor. Ele também. Sem perceber amávamos Marilia. Ela era a esposa de nós dois. Não sei se ela gostava do sexo que fazia conosco uma noite comigo e outra com Alfonso. Sabia que Alfonso era igual a mim. Só um papai e mamãe, sem muitas delongas e logo terminávamos. Ela se levantava ia se lavar e ia dormir. O sexo só à noite. Como eu e Alfonso ela não dizia nada. Não ria, não chorava e nunca nos contou sua história. Pelo menos falava monossílabos. Boa noite e bom dia. Sabíamos que ao levantar o café estava pronto, sempre pães e bolos na mesa. Mesa onde não se ouvia conversa, causos nada. Cada um saia para seu trabalho na mesma hora e parecia combinado chegar também na mesma hora. Fizemos questão de dois banheiros. O banho era no mesmo horário. Cada um cada mês tirava da carteira quinhentos reais e dava para ela. O que deixamos em cima da mesa era para as despesas da casa.

                         Um dia quando chegamos não vimos mais Marilia. Ela havia partido. Ninguém perguntou para o outro o porquê. Várias semanas eu senti uma falta grande dela e sabia que Alfonso também mesmo sem falar um com o outro. Não houve reclamações, culpas, nada. Aceitamos como sempre aceitamos tudo que aconteceu em nossas vidas. Passou-se um ano. Nunca mais fizemos sexo com ninguém. Eu dizia para mim que só se um dia Marilia voltasse. Sabia que ele também. Ao completar três anos que Marilia foi embora eu ele em uma noite jantando em uma lanchonete proximo a nossa casa vimos ela parada em nossa mesa, de pé, com os mesmos olhos do passado. Com a cabeça pedimos para sentar. Comeu três vezes. Estava faminta como na primeira vez. Levantou, agradeceu baixinho e partiu. Não foi como a primeira vez que nos seguiu até em casa.

                          Foram mais dois anos e na mesma lanchonete ela apareceu novamente. Desta vez não veio a nossa mesa. Estava com outro homem. Sorria escandalosamente. Por várias vezes nos olhava e cochichava para ele dizendo alguma coisa. Ele dava grandes gargalhadas olhando para nós. Saímos e ficamos parados na esquina. Meia hora depois eles saíram. O seguimos o que pareciam se dirigir a sua casa. Quando eles entraram esperamos duas horas e forçamos uma janela e entramos. Os dois estavam dormindo em um quarto de casal. Eu segurei a mão dele enquanto Alfonso o enforcava com as mãos. Ela nos olhava com um terror enorme não acreditamos no que estávamos fazendo. Quando vimos que ele morreu, saímos da casa e fomos embora. Ela não nos seguiu. Não nos denunciou na policia. Nunca comentou com ninguém o que fizemos.

16 de março.  

                        Descobri este diário que não conhecia quando eles foram trabalhar. Li o que eles escreveram e resolvi escrever também. Precisava. Alguém devia saber o que aconteceu. Vocês sabem que eu sou a Marilia. Nasci de uma família humilde que me deixou dentro de uma caixa de papelão na porta da igreja quando tinha dois meses. Sei que quando entendi onde estava já tinha oito anos. Morava com um casal de velhos. Bem velhos. Dona Maria me dava duas surras por dia. Ela dizia – A primeira é para corrigir você, a segunda é para não esquecer. Eu sabia que não tinha feito nada. A velha queria se vingar de alguma coisa. Fugi de casa. Encontrei um homem bom e me deu guarida, dinheiro e sexo. Foi com ele que aprendi o que sei hoje. Um dia ele morreu e não me deixou nada, era casado e tinha filhos. Perambulei pelas ruas a cata de dinheiro e comida. Não era uma prostituta, não tinha jeito para isto. Se alguém quisesse pagar íamos em um beco ou no mato, seja lá onde for e fazia o que ele queria.

                       Um dia a patrulha nos pegou no fraga na porta de uma casa. Eu estava sem calcinha e ajoelhada. Ele correu e os guardas deram uns tiros que não acertou ninguém. Levaram-me com eles para uma casa vazia. Bateram-me tanto que desmaiei. Quando acordei estava jogada em uma cadeia imunda com outras mulheres da vida. Fiquei ali por cinco meses. Nem sabia minha culpa. Um dia me soltaram e fiquei marcada com muitos policiais. Sempre me comiam de graça sem pagar e ai de mim se reclamasse. Quando aquele dia entrei na lanchonete e vi Alfonso e Mariel pedi ajuda. Estava com fome. Eles me trataram bem. Nunca me maltrataram e nem sei porque fiz aquilo. Mas a vida não foi boa comigo. Encontrei um rapaz simples, pobre e que gostou de mim. Larguei os dois e fui morar com ele. Um dia eles entraram em nossa casa e o mataram. Jurei vingança. Voltei para a casa deles. Nem me disseram boa tarde e nem boa noite quando chegaram. Para eles eu devia estar ali sempre para servi-los. Sabia que minha hora chegou.

                        Consegui na quitanda do seu Ramon um frasco de um pozinho que ele me garantiu quem cheirasse ou tomasse água e ou outra coisa com ele misturado iria dormir um sono pesado por muito tempo. Não iria morrer, mas nem saberia de nada enquanto dormia. Justo o que eu queria. A noite preparou um suco para eles e coloquei o pozinho. Eles foram dormir logo e nem banho tomaram. Dormiram como uma pedra. Fui até lá com um facão, corte a cabeça de cada um, o saco e o membro. Cortei uma perna e um braço. Sorria quando fazia isto. Vingança é assim? Sei não meu ódio era demais. Eu poderia ter casado com Henrique, quem sabe hoje teria filhos e poderia ser feliz. Eles não deixaram. Nunca tive instintos assassinos e nem sei por que corte eles daquele jeito. Sai dali depois de revistar tudo que tinham. Descobri uma caixa de papelão escondida entre as roupas deles. Muito dinheiro. Era o que queria. Sumi neste mundo de Deus. Ninguém nunca mais ouviu falar de mim.

     
“Não me arrependo de nada que tenha alcançado as coxas
não nego coisa alguma que passe perto do coração
se fiquei roxa foi porque teve ação”. Martha Medeiros.

A vida é uma tragédia.
Sua história é uma epopeia.
Suas frases são versos.
Suas ações são uma peça.
Deixe-me ser sua simetria.
Faça-me bela como a nona sinfonia.
Torne-me o motivo da guerra de Tróia.
Lapide e crie a mais bela joia.
Contudo, o fim é cruel.
Não vou negar o que sinto por você,
E beberei cicuta.
Chamar-te-ei Tétis, e será minha ninfa,
E estarei preso nas tormentas.
Ficarei na incerteza de sua traição,
E serei mais um casmurro.
O Destino, autor da minha literatura
É inteligente e irônico,
Ele tornou-me um clássico,
Minha vida em folhetins que são escritos todos os dias.

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