Bem vindo ao blog do Osvaldo

Seja bem vindo a este blog. Espero que aqui você encontre boas historias para passar o tempo, e claro, que goste.

Honrado com sua presença. Volte sempre!

domingo, 22 de março de 2015

A sombria e esquecida cidade de Cordel Azul.



Mistério

Gosto de ti, ó chuva, nos beirados,
Dizendo coisas que ninguém entende!
Da tua cantilena se desprende
Um sonho de magia e de pecados.

Dos teus pálidos dedos delicados
Uma alada canção palpita e ascende,
Frases que a nossa boca não aprende,
Murmúrios por caminhos desolados.

Pelo meu rosto branco, sempre frio,
Fazes passar o lúgubre arrepio
Das sensações estranhas, dolorosas…

Talvez um dia entenda o teu mistério…
Quando, inerte, na paz do cemitério,
O meu corpo matar a fome às rosas!

A sombria e  esquecida cidade de Cordel Azul.

               Todos diziam que Cordel Azul foi no passado uma linda cidade, cheia de vida cheia de alegrias, sua praça e seu coreto sempre cheias de gente. As ruas eram limpas, o sol brilhava, e as noites se faziam lindos saraus e nas ruas sempre tinham os seresteiros cantando juras de amor as suas amadas. Os pássaros em bandos cantavam nas arvores e o céu a noite tinha as estrelas mais lindas do universo. Um dia  Jasão de Albuquerque chegou à cidade. Tinha uma perna mais curta que a outra e apesar de fazer tudo para não mancar não adiantou. – O manco chegou à cidade! Disseram a molecada brincando com Jasão. Ele era caladão, não respondia, e seguiu seu caminho até o Bar do Firmino. Sentou e pediu uma pinga – Deixa a garrafa, por favor! Todos olharam espantados para Jasão. Bebeu devagar, copo por copo. Terminou e perguntou ao Firmino onde poderia se hospedar.

               Cordel Azul era uma cidade pequena, três mil almas? Por aí. Todos se conheciam, os ricos eram ricos e os pobres eram pobres. O Juiz Comendador Salomon de Piaçaba era o dono da cidade. Seu bisavô chegou por volta de 1850 e se assenhorou de boa parte das terras. De pai para filho se chegou ao Juiz Salomon. Ele mesmo foi quem fundou a cidade. O governador prometeu que a estrada de ferro passaria por lá e ela nunca deu as caras. Mesmo assim o povo que morava nas estancias e proximidades do Rio Azul se aglomeraram lá, uns fizeram um moinho, outros uma olaria, O pai de Firmino inaugurou seu bar servindo cachaça para todo mundo. O povo era feliz. O padre satisfeito com Sulamita que no dia limpava a capela e noite servia o padre na cama episcopal. Ninguém incomodava ninguém. Viver e deixar viver era o lema da cidade. Se o Comendador Salomon não quisesse ele que se manifestasse.

                  O botequeiro Firmino olhou espantando para Jasão. Vai dormir aqui? Jasão olhou para ele franzindo a testa e nada disse. – Olhe moço, não tem hotel nem pensão aqui. Dona Veneranda costuma alojar os caixeiros viajantes. Siga na rua ao lado e no final vai ver a casa dela. Tem um pé direito alto, janelas tipo renascentista, toda pintada de verde musgo. Jasão tirou uma nota de cinquenta reais e pagou. – Sem troco moço! Fique com a nota e abra uma conta para mim. Jasão partiu sem despedir de ninguém. Até hoje ninguém soube o que ele falou para Dona Veneranda, mas ela o aceitou e a cidade em peso querendo saber do novo inquilino. Eles conheciam Dona Veneranda. Um tumulo. Parecia que ela não gostava da cidade. Passou-se duas semanas e ninguém viu se Jasão ainda estava na cidade. Se ele foi embora devia ter sido à noite. Naquela tarde modorrenta de um setembro qualquer Jasão apareceu. Bateu na porta do Comendador e Pancrácio seu mordomo atendeu.

                  - Pois não? Com uma cara de poucos amigos Jasão custou a responder. – Chame o Comendador! – Pancrácio olhou incrédulo aquele forasteiro. Ninguém tinha a audácia de procurar o Juiz Comendador Salomon. Se alguém aparecia era convidado ou intimado. Se intimado podia rezar e pedir a Deus que o recebesse no céu. – Ele não atende respondeu Pancrácio. Jasão não se fez de rogado, deu meia volta, foi até a loja do Romano e comprou uma caixa de foguetes de um só tiro. Voltou e no segundo disparo de seu foguete o Comendador chegou à porta. Zunia de raiva. Na sua mão uma espingarda de pederneira, uma arma longa cujo mecanismo de disparo era um fecho de pederneira. Mortífera para quem tinha boa pontaria e mortal para quem estivesse na sua frente. Jasão levantou a mão esquerda e falou baixinho: - Sou seu merda, o Jasão  pai da Thabita que o senhor engravidou e deixou-a na miséria!

                      O Comendador Salomon levou um susto enorme. A história toda se passou em sua mente. Conheceu, prometeu e comeu. Depois que embarrigou sumiu. Achou que era um menina qualquer. Não tinha mais que treze anos. Mas gostosa e como ele gosou na menina! Não deu tempo para pensar mais nada. Jason tirou da sua calça um pequeno Colt 22 que um só tiro certeiro bastou para entrar pela testa do Comendador e sair de lado atrás da orelha. O famoso Salomon caiu feito uma barrica d’água se quebrando e se encontrando com os capetas dos infernos! Jason saiu calmamente sem se importar com o reboliço dos empregados e do miserável do seu mordomo Pancrácio. Jason foi para a casa de Dona Veneranda. Não fugiu. Ninguém foi à procura dele. Não havia delegado na cidade, pois o Comendador era o Rei de tudo.

                     Por meses ninguém viu mais o Jason. O Comendador foi enterrado com honras de estilo. O Coronel Sansão mandou uma tropa de cavalaria para prestar as honras de praxe. Vinte e um tiros, hino nacional e debaixo da terra jazia o comendador que comeu e agora vai comer terra até os bichinhos o comerem também. Ninguém perguntou quem matou porque matou. O próprio Coronel nem na cidade foi para despedir do Comendador. Para dizer a verdade a cidade de Cordel Azul passou a sorrir mais do que sorria. Festas aconteciam todo sábado, até um Clube da Roseta foi organizado com bailes dançantes três vez por semana. Simão de Piaçaba chegou à cidade a noitinha. Ninguém o reconheceu. Largou seu pai com quinze anos e sumiu no mundo. Ninguém mais soube dele. A cavalo e imponente como um Lord Inglês não cumprimentou ninguém, foi direto a casa de Dona Veneranda, apeou e chamou Jason. Um tiroteio  aconteceu. O dia amanheceu. O corpo de Jasão na porta ensanguentado e o corpo de Simão não dava sinal de vida.

                     Durante meses a cidade permaneceu calada quieta e pacata. Mas quando a noite chegava o inferno descia na cidade. Eram gritos horrendos tiros, berros e raios caindo por todos os lados. A cidade praticamente acabou. Muitos mudaram para nunca mais voltar. O romance do Padre com a Sulamita continuava. Nasceu uma menina que batizaram de Thabata. Ninguém maldisse o padre. Se ele queria mulher porque não? Sulamita foi morar com ele. O Bispo Teobaldo soube e nem ligou. Se ele quer foder que foda! Ele disse. Thabata cresceu. Linda, uma morena de se tirar o chapéu. Só tinha um problema, Thabata era alcoviteira, sonhava em ser princesa, começou a ter fama de levar para a cama a maioria dos homens de bem. Se Cordel Azul definhava agora muito mais. Não se sabe como, mas Thabata se tornou dona da Fazenda do Comendador Salomon. Até mesmo o mordomo Pancrácio tinha eterna veneração por ela.

                    Salatiel morava em Monte Alegre. Era um jovem que apreciava a boa comida, a boa vida e a riqueza. Ali em sua cidade ele sabia que não ia conseguir nada. As histórias fantásticas de Cordel Azul eram motivos de risadas, de comentários e então começaram a falar em Thabata. – Linda diziam. Gostosa! Dizia outro. A bunda dela faz jus ao maior tesão do Brasil. E sabem da melhor? Um falou! – Cheia da grana. Comprou um carrão de dar inveja. Sua fazenda virou mansão. Salatiel ouvia e sorria baixinho. Minha vez chegou. Vou passar uma temporada em Cordel Azul. Pegou sua mula selou e partiu para seu destino. Salatiel não tinha um puto, duro duro. Sua família vivia com o auxílio do Salário Família. Era hora de enricar. Ele sabia que tinha estampa, loiro, alto e forte. Conversa de gostosão. Andava gingando e as moçoilas de Monte Alegre adoravam. Ele comeu a maioria, mas casar? Pobre comigo não, dizia.

                      Quando entrou em Cordel Azul ele levou um susto. Não esperava uma cidade assim. Triste escura, silenciosa. Parou no Bar do Firmino. Desceu como um galã de faroeste. Pediu uma pinga e informações. No bar só ele e um Velho. – Pode-me dizer onde fica a fazenda do falecido Comendador Salomon? Todos olharam espantados. O Velho sorriu mostrando não ter um dente na boca. Firmino não se fez de rogado. Quem sabe ele retiraria a praga que se abateu em Cordel Azul? Firmino não era poeta, mas escrevia poesias. Tinha saudades do tempo de outrora das cantorias, dos pardais, da alegria no domingo ir à missa, de falar mal do padre e sua amasiada, era bom demais. Andou escrevendo versos e até na privada ele escreveu: -    “Neste lugar sagrado”, Toda vaidade se acaba. O mais covarde se esforça, E o mais valente se caga! Ele gostava de escrever, mas não tinha ninguém para ler. A cidade tinha uma escola e uma professora, mas magra feito à peste e se olhava você parecia querer te matar com um raio.

                    - Melhor não me meter na vida dos outros – Siga em frente e quando a rua terminar vai encontrar a trilha que o levará a fazenda que hoje é da Dona Thabata, que lá mora sozinha e não tem ninguém ao seu lado! – Poderia ter rido, mas não riu. Que o forasteiro se fodesse. Ele não tinha nada com isto. Salatiel agradeceu fazendo um gesto no seu chapéu. Montou na sua égua e partiu. Olhe ninguém soube o que aconteceu lá. O que podem contar que naquela noite uma tempestade caiu sobre Cordel Azul. Dizem que os raios partiram arvores centenárias. Se o forasteiro era o responsável ninguém nunca soube. No dia seguinte um clarão se fez formar no céu. Assustou todo mundo. Uma gargalhada se fez ouvir. Centenas de espíritos correram pelo céu. Alguém descobriu que Salatiel era filho do padre com outra mulher. Se Thabata descobriu ninguém nunca soube. Mas uma coisa me garantiram, Cordel Azul se transformou, a cidade voltou a sorrir, a cantar e nas ruas à noite as serestas aconteciam. O clube da Roseta se transformou em Bordel.

                             Hoje dizem que Cordel Azul tem mais de vinte mil habitantes. Dizem que a neta de Dona Veneranda abriu o maior hotel das redondezas. A putaria tomou conta da cidade de Cordel Azul. E daí? Quem se importava? A cidade ficou famosa. Seus cassinos, suas boates, suas mulheres correram o mundo. Sentado na varanda de sua mansão o Comendador Salomon com Thabata eu seu colo, tirava sarro de Jason e Salatiel que presos por demônios queriam se libertar das correntes que o prendiam. Thabata a menina filha do padre agora mandava em tudo. Pena que ninguém via só as almas do outro mundo onde agora viviam as personagens deste conto. Se assim foi assim será escrito! Entrou por uma porta e saiu em outra!

Mistério
Gosto de ti, ó chuva, nos beirados,
Dizendo coisas que ninguém entende!
Da tua cantilena se desprende
Um sonho de magia e de pecados.

Dos teus pálidos dedos delicados
Uma alada canção palpita e ascende,
Frases que a nossa boca não aprende,
Murmúrios por caminhos desolados.

Pelo meu rosto branco, sempre frio,
Fazes passar o lúgubre arrepio
Das sensações estranhas, dolorosas…

Talvez um dia entenda o teu mistério…
Quando, inerte, na paz do cemitério,
O meu corpo matar a fome às rosas!

sábado, 7 de março de 2015

Uma estrada para o inferno!



Perdido na estrada do inferno,
Você é seu único Deus.
Além do frio sem inverno
E um nada prá esperar...

E eu te falo
Estrelas negras
Não aparecem no céu.
Sem o brilho da saliva,
Do teu cuspe prá acordar
Sangue estragado vermelho
Na estrada para o inferno
E um infinito para atravessar...

Demônio na noite,
Sou euuuuuu!
Sou euuuuu!
Sou euuuuu!

Passageiro de um destino
Que nem mesmo sabe onde chegar,
Anjo negro suicida
E um profundo abismo prá dragar...
Enfeitado em flor de plástico
Você é seu único Deus.
Perdido na estrada do inferno
E todo o resto prá dizer adeus...

A loucura devora a alma
Por favor, esqueça
Dane-se Exploda-se
Que tudo apodreça
Demônio na noite,
Sou euuuuuu!
“Bruna”

Uma estrada para o inferno!
“O inferno são os outros”.

               O tiro atingiu bem no meio da testa de Salamanca. Um pequeno buraco na frente e outro enorme atrás. Ele caiu duro na soleira da porta. Solange sua esposa veio correndo e nem soube quem a matou. Um tiro perfeito no coração. Calixto ouviu um choro de criança, desceu do cavalo e na pequena sala o menino de uns quatro meses chorava. Nem apontou atirou de primeira. O tiro atravessou a boca do menino e ele morreu na hora. Calixto nem foi ver se todos estavam mortos. Não precisava. Ele sabia que onde olhava a bala estava lá. Sua pontaria era terrível. Largou os corpos lá e partiu para a casa de Alencar. Não era longe, umas duas léguas no máximo. No caminho pensava no dinheiro que o Coronel Calazans tinha prometido. Pagou a metade e a outra só quando terminasse o serviço. O Coronel não explicou porque precisava de todos mortos. Ele também não perguntou. - Cinco mil por cabeça – ele disse. Não quero testemunhas, mate todos que estiverem por lá ou quem encontrar no caminho!

             Do alto da colina avistou a casa de Alencar. Na porta duas crianças brincando. – Seu pai? – Na roça Seu Moço! Maria veio ver quem era. Não deu tempo. Três tiros três mortos. Atrás da choupana Alencar chegou correndo. Mais um que recebeu um prêmio, um passaporte para o inferno. Morreu na hora com um tiro na boca. Faltavam ainda Nonô, Policarpo e Esmeralda. Matar uma moça sem pai e sem mãe? Não importava. Ele fora pago para isto. Nunca teve dó, pena, piedade. Já tinha perdido a conta de quantos havia matado. O dia estava terminando. Ele precisava parar e arranchar. Não dava para matar todo mundo num só dia. Parou próximo a um pequeno regato, jogou sua manta e dormiu. Acordou com uma fome “braba”. No bornal preso na sela ele tirou um pedaço de carne seca. Comeu sem cozinhar. Montou no cavalo e partiu. Na estrada viu alguém correndo. Estava em uma égua pequena, quando ele viu Calixto pediu a Deus por sua vida. Não adiantou. Deus não o atendeu. Morreu na hora com a bala de winchester que carregava preso a sela. Calixto não queria saber quem era.

                    Ele pensou que era alguém indo avisar os demais do matador que o Coronel contratou. Agora ele está lá, na porta do inferno conversando com o diabo esperando outros que em breve iriam chegar. Era um contratempo. Pensou em encontrar todos eles desprevenidos. Bem, dinheiro não cai do céu. Estava fácil demais. Viu de longe na trilha a fumaça na casa de Nonô. Quem sabe ele ainda não fora avisado? Ledo engano. Ao atravessar o Ribeirão das Cobras balas zuniam sobre sua cabeça. Calixto riu. Porra, o danado está armado! Parecia ser mais de um. Lembrou que o Coronel disse que ele tinha um filho de desesseis anos. Bem os dois devem estar armados. Vamos esperar a noite chegar. Procurou uma moita de capim colonião e deitou dormindo na hora. Os tiros cessaram. Quem sabe eles achavam que ele estava morto, mas ninguém foi lá para ver. Calixto acordou com noite escura. Olhou sua winchester e viu que estava pronta para cantar. Arrastando foi devagar até a casa de Nonô. Tudo escuro. Ele sabia que eles estavam lá dentro. Ele sabia que fugir dele era cair na frigideira.

                 Meteu o pé na porta e mesmo no escuro sentiu o fedor da morte. Não deu tempo para nada. Três tiros, três mortos. Melhor era confirmar se estavam a caminho do inferno. A noite todos os gatos são pardos. Mortinhos da silva. A mulher, o menino e Nonô. Ele sabia que o Coronel iria pagar por cada morte que ele encomendou. Procurou no quarto embaixo da cama se não tinha mais alguém. Não tinha. Calixto estava cansado de tanto cavalgar. Ele sabia que podia ficar mais uma semana na sela do cavado baio. Mas amanhã é outro dia e ele pensava que podia acabar de vez com a empreitada. Faltava Policarpo e Esmeralda. Se Deus ajudasse ele mataria os dois em um só dia. Resolveu dormir ali na casa de Nonô. Nem se preocupou em tirar os cadáveres da sala. Deixe eles lá. Não estão mais no corpo. Ou foram para o céu ou para o inferno. Deitou na cama de Nonô e dormiu em menos de dois minutos.

                Nem bem o sol apareceu e Calixto já estava na estrada rumo à casa de Policarpo. Iria deixar Esmeralda por último. Estava na campana há dias e precisava comer uma mulher. Disseram a ele que Esmeralda era uma moça linda e gostosa. – Como ela e meto uma bala nela depois de gosar pensou. Ele não entendia porque o Coronel Calazans queria matar todos eles. Quem sabe a nova lei do usucapião? É o tal negócio, você dá a mão e o cara quer tudo! Não dizem que quem tudo quer tudo perde? Interessante que as roças que viu eram uma merda. Ficar ali contra a vontade do coronel e não ter nada era só mesmo para filhos da puta que não queriam trabalhar. Às onze da manhã avistou a casa de Policarpo, ele estava sentado no banco na porta da sala. Será que ainda não sabia? Apalpou seu colt 45 e viu que estava bem no coldre. Já tinha visto as balas que colocara e elas já tinham dono e destino. Chegou sério até onde estava Policarpo. Ele não era de sorrir. Dizia para si mesmo que quem rí muito é viado.

                Policarpo olhou para ele e nos seus olhos Calixto viu a morte. Pulou do cavalo na hora que o tiro ecoou. A mulher de Policarpo estava armada e esperando ele chegar. Viado filho de uma puta. Quase me pegou. Policarpo deu um salto e atirando com um Taurus simples errou o primeiro tiro e o segundo engasgou. Tá fudido home! Comece a rezar, pois vai morrer agora disse Calixto. O primeiro tiro foi para Lena a mulher dele que estava na janela pronta para o segundo tiro. Ela nem sabe como morreu. De raiva Calixto descarregou o Colt em Policarpo. Cada tiro ele dançava no ar. O sangue espirrava e as balas de Calixto brincavam em entrar naquela pele negra, mas com sangue vermelho. Policarpo girou como um peão danado, sentindo a morte tomando conta dele e pedindo ao demônio que matasse aquele matador filho de uma égua. Calixto sentiu uma queimação na perna direita. Sangue jorrava e a calça estava vermelha. Danado, ele me acertou. Tirou a calça e viu que era um buraquinho de nada. A bala entrou e saiu.

                      Entrou na casa a procura de filhos e não encontrou ninguém. O filho da mãe havia despachado os três filhos antes da chegada dele. Agora seria difícil descobrir onde estavam. Quem sabe na montanha do Grilo? Bem ele ia até lá depois de foder e matar Esmeralda. Só de cueca foi até a bica no quintal e limpou a ferida da bala. Ardeu mas nada parecido com a ultima bala que recebeu nas costas. “Geraldino atirou nele pelas costas” Filho da puta! Ele até hoje nas prefundas do inferno deve estar gemendo. Morreu com quinze facadas. Não ia desperdiçar uma bala naquele demônio do caralho! Ficou de molho dois meses sem matar ninguém. Se sentiu órfão. Não gostava de ficar parado. Ele gostava de matar, matava tudo que era vivo e alguém pagava para acabar com o danado. Ele sabia que tinha muito dinheiro guardado. Não gostava de bancos. Comprou um baú a prova d’água, passou muito mel em volta, deixou secar e abriu uma pequena fenda no Rio das Mortes e lá preparou para guardar seu baú cheio de dinheiro.

                      Calixto chegou à casa de esmeralda à tardinha. Encostada na soleira da porta não fez nenhum sinal de medo ou que iria correr. Puta de uma morena bonita e gostosa. Que lábios para morder ele pensou. Peitos enormes, cabelos negros compridos do jeito que ele gostava. Sentiu um perfume no ar. Ela sorria para ele e devagar levantava a saia para ele ver a calcinha dela. Filha da mãe! Pensou. Me deixou duro. Saltou do cavalo e a pegou pelos cabelos arrastando até a cama. Jogou-a brutalmente no estrado, tirou seu membro para fora, rasgou a calcinha dela e meteu com força. Ele gostava assim. Este negócio de deixar a mulher gosar é coisa de bicha escrota. Não dava folga. Metia com força e viu que ela gemia. A puta estava gostando! Mulher é assim, sabe quando gosar. Fechou os olhos para jogar toda a porra dentro dela. Não esperava o que ela fez. Sentiu uma faca entrando em sua jugular. Espirrou sangue prá todo lado e a respiração era difícil.

                        Agora sabia que ia morrer. Queria matar a puta dos infernos, mas não tinha força. A faca encravada em sua garganta não lhe dava paz e nem maneira de pensar. Ele morria aos poucos. Esmeralda sentou na cama se ajeitando e rindo. Olhou para ele sem nada dizer. Ele olhou para ela e pensou que poderia ter feito dela sua mulher. Precisava de uma mulher assim. Valente sem medo e gostosa prá burro. O jeito era esperar o capeta chegar. Não ia rezar, sabia que Deus não iria perdoar seus pecados. Nunca rezou na vida. Nem mesmo quando matou o Monsenhor Diácono na sacristia. Matou rindo e o pendurou na imagem do cristo. Imagem? Uma estátua feia e sem valor para ele. Melhor fechar os olhos e só abrir quando chegasse ao inferno. Não deixou nada para trás, nunca teve nada a não ser seu dinheiro preso em um baú na beira do rio. Ia ficar para as piranhas se elas gostassem das verdinhas de cem.

                       Esmeralda foi até o córrego e tomou um belo banho gelado. Lavou bem suas entranhas para não ficar marca daquele bandido filho da puta. Vestiu uma calça simples e uma camisa estampada. Colocou um chapéu de palha e partiu no cavalo baio de Calixto. Bom cavalo, marchador. Ela conhecia um bom animal. Estava escurecendo quando chegou à fazenda do Coronel Calazans. Ele a esperava em pé na varanda. – Matou? – Mortinho da silva Coronel. Bom serviço! – Desceu os três degraus e entregou a ela uma sacola de dinheiro. Estava livre de todo mundo. Olhou para Esmeralda, vai ser bonita e gostosa assim no inferno, pensou! Ela sorriu. Sabia quando o Coronel queria foder. Mas não desta vez. Ela não confiaria nele nunca. Meteu a espora no baio e sumiu na trilha da Ema. Ninguém nunca mais ouviu falar dela.

Prologo: - Juventino notou que Calixto não mais apareceu no seu casebre na beira do Rio Pardo. Passou um mês, dois e nada. - Morreu o desgraçado pensou. Foi até a beira do rio onde sempre viu Calixto tirar e colocar um baú dentro d’água. Achou a cordinha de nylon e a puxou. O baú veio à tona. Abriu a tampa e viu sorridente um monte de dinheiro. Melhor ficar com ele do que com os peixes do rio, pensou. Arrastou o baú até sua casa. Vovó Mafalda sorriu quando viu tanto dinheiro. Juventino nos seus treze anos nem sabia quanto tinha, sua Avó foi quem disse que eles tinham enricado. Mudaram para São Lourenço uma cidade bem grande e que ninguém iria perguntar aquela velhinha e aquele negrinho como eles conseguiram comprar a casa de Dona Antônia. É como dizem. A males que vem prá bem. Calixto no inferno e Juventino gastando seu dinheiro a rodo. Dizem que eles viveram felizes para sempre!

Aqueles que escapam do inferno
nunca falam sobre isso
e nada mais incomoda eles
(...)
Quero dizer, coisas como
falta de uma refeição,
ir para a cadeia,
bater seu carro
ou mesmo morrer.

Quando você perguntar-lhes,
"como as coisas estão indo? "
eles vão responder: "bem, muito bem... "

Uma vez que você foi para o inferno e voltou
é o bastante
é a mais silenciosa celebração conhecida.

Uma vez que você foi para o inferno
e voltou você não olha para trás
quando o chão range.
o sol está no alto à meia-noite

E coisas como os olhos de ratos
ou um velho pneu em um terreno baldio
pode torná-lo feliz.
(...) Uma vez que você foi para o inferno
e voltou.