Ouvir
estrelas...
“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...
E conversamos toda a noite, enquanto
A Via Láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?"
E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e entender estrelas”.
“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...
E conversamos toda a noite, enquanto
A Via Láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?"
E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e entender estrelas”.
O doce sabor
de um sorriso
Nasci em uma manhã de sol radiante,
num pequeno hospital próximo ao bairro que minha mãe morava. Era um bairro
humilde, onde os vizinhos tinham respeito entre si, eram grandes amigos e
ninguém deixava de ajudar quando preciso. Quando nasci todos sorriram. Mesmo
chorando eu tinha um lindo sorriso no rosto. Amargo sorriso. Acompanhou-me a
vida toda. Tinha desprezo pelos espelhos. Não gostava de me ver. Aquele sorriso
não se modificava mesmo que quisesse. Podia chorar gritar entortar o rosto e lá
estava ele nos meus lábios. Cresci odiando meu sorriso. Na escola todos viviam
sorrindo para mim, os professores me olhavam e sorriam. Deus meu! Porque era
assim? Uma aberração da natureza?
Os rapazes se aproximavam de mim
com extrema facilidade. Claro, eles achavam que eu estava sorrindo para eles e
era uma presa fácil. Corpo cheio, seios volumosos, nem gorda e nem magra e meus
cabelos para dizer a verdade eram negros brilhantes e todos me olhavam
embevecidos. Aqueles que escolhia ficavam comigo pouco tempo. Cansavam do meu
sorriso. Achavam que eu estava fingindo. O namorado que mais durou foi com o
Mario Augusto. Oito meses. Até o dia em que ele me levou a um imundo motel e me
possuiu brutalmente. Ele também era virgem e fez o que os outros o ensinaram.
Ridículo. Nem a roupa tirou. Tinha vergonha. Fez um sexo idiota que eu mesma
sendo virgem quase ri da sua estupidez em me possuir.
Até hoje não sei se choro por
dentro ou se sorrio. Mario Augusto se
vangloriou com seus amigos que eu “dei” para ele sorrindo. Um sorriso idiota de
puta “sacana”. Que ódio. Vontade de matar o Mario Augusto. Mas a vida nos
ensina muitas coisas. Dizem que a vida é uma grande universidade, mas acho que
ela pouco ensina a quem não sabe ser bom aluno e eu acredito não ser uma. Antes
de completar dezoito anos, consegui um emprego. Fiquei nele dois dias. Meu
chefe achou que eu estava sorrindo para ele e veio com aquela conversa
enviesada. Porque não podia ficar séria? Tirar aquele sorriso “besta” no rosto?
Isto não podia continuar assim. Chamei minha mãe e ela conversou com meu pai.
Meu pai não se preocupava, achava que eu era feliz. Nunca entendeu por que eu
sorri a vida toda ao lado dele.
Um médico me examinou e sorriu. –
Linda sua filha! Linda, e que sorriso! Meu Deus ninguém para entender?
Resolveram me levar a um psicólogo. Deitei na poltrona e ele me olhando e
sorrindo. Não tirava aquele sorriso idiota do rosto. Nunca mais voltei lá. O
tempo foi passando, todo mundo me olhando e sorrindo. Acostumei. Sabia que não
havia como evitar. Conheci Joca quando estava uma livraria próxima a minha
casa. Tentava achar um livro que procurava há muito tempo. O Outono do Patriarca.
De Gabriel Garcia Marques. Foi quando o vi retirando um livro da prateleira.
Devia ter visto o livro que procurava e se assim o fosse teria tomado
conhecimento de quem era ele, mas como diz um velho ditado, só o tempo sabe a
resposta. Um belo jovem. Alto, cabelos pretos bem penteados, magro, e também
tinha um belo sorriso.
Foi amor à primeira vista. Apaixonamos-nos
e nos casamos em dois meses. Meus pais foram contra. Mas quem segura à
juventude? Os seus sonhos? Os seus desejos? Disseram-me uma vez que a infância
é a idade das interrogações, a juventude a das afirmações e a velhice a das
negações. Será verdade? Não sei. A vida real do ser humano consiste em ser
feliz. Isto porque está sempre na esperança de sê-lo muito em breve. Fui morar
com ele em sua fazenda no interior de Goiás. Não era a casa dos meus sonhos,
mas vivi com ele uma linda historia de amor. Amamos-nos em todos os lugares da fazenda.
Joca era paciente, um amante a moda antiga. Sabia como fazer e eu me tornava
super excitada com ele nestes momentos. Uma vez nas margens do pequeno rio
Corumbá, um pescador nos viu nus, nos amando como dois amantes sedentos. Ele
parou o barco e ficou ali até terminamos. Nunca fui uma “voyeur”. Naquele dia
senti um prazer enorme em saber que estava sendo observada.